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05/05/2008

Resumo: Teorias da Constituição
Autor: Vicente Paulo
1) KARL LOEWENSTEIN: CONSTITUIÇÃO NORMATIVA, NOMINATIVA E SEMÂNTICA

O constitucionalista Karl Loewenstein desenvolveu uma classificação para as Constituições, levando em conta a correspondência existente entre o texto constitucional e a realidade política do respectivo Estado. Para ele, as Constituições de alguns Estados conseguem, verdadeiramente, regular o processo político do Estado; outras, apesar de elaboradas com esse mesmo intuito, não conseguem, de fato, normatizar a realidade política do Estado; outras, sequer têm esse intuito, visando, tão-somente, à manutenção da atual estrutura de poder.

Nascia, assim, a classificação das Constituições quanto à concordância com a realidade, que divide os textos constitucionais em três grupos: Constituições normativas, Constituições nominativas e Constituições semânticas.

As Constituições normativas são aquelas que conseguem, efetivamente, regular a vida política do Estado; são as Constituições que estão em plena consonância com o cotidiano do Estado, que conseguem, de fato, dirigir o seu dia-a-dia.

As Constituições nominativas são aquelas que, embora tenham sido elaboradas com o intuito de regular a vida política do Estado, não conseguem efetivamente cumprir esse papel; são Constituições em descompasso com a realidade do Estado, que não guardam correspondência com o seu dia-a-dia embora tenham esse intuito.

As Constituições semânticas são aquelas que, desde sua elaboração, não têm o objetivo de regular a vida política do Estado, mas sim de formalizar e manter o poder político atual, de dar legitimidade formal aos atuais detentores do poder; não tem ela a pretensão de limitar o poder real, mas sim de formalizar e manter o poder existente. Nas palavras de Karl Loewenstein, seria uma Constituição que não é mais que uma formalização da situação existente do poder político, em benefício único de seus detentores .

2) CONSTITUIÇÃO EM SENTIDO SOCIOLÓGICO

Na visão sociológica, a Constituição é concebida como fato social, e não propriamente como norma. O texto positivo da Constituição seria resultado da realidade social do País, das forças sociais que imperam na sociedade, em determinada conjuntura histórica. Caberia à Constituição escrita, tão-somente, reunir e sistematizar esses valores sociais num documento formal, documento este que só teria valor se correspondesse a tais valores presentes na sociedade.

Representante típico da visão sociológica de Constituição é Ferdinand Lassalle, segundo o qual a Constituição de um País é, em essência, a soma dos fatores reais de poder que regem nesse País.

Segundo Lassalle, convivem num País, paralelamente, duas Constituições: uma Constituição real, efetiva, que corresponde à soma
dos fatores reais de poder que regem nesse País; uma Constituição escrita, por ele denominada folha de papel . Esta, a Constituição escrita ( folha de papel ), só teria validade se correspondesse à Constituição real, isto é, se tivesse suas raízes nos fatores reais de poder. Assim, em caso de conflito entre a Constituição real (soma dos fatores reais de poder) e a Constituição escrita ( folha de papel ), esta sempre sucumbirá perante aquela, em virtude da força dos fatores reais de poder que regem no País.

É também sociológica a concepção marxista de Constituição, para a qual a Constituição não passaria de um produto das relações de produção e visaria a assegurar os interesses da classe dominante. A Constituição, norma fundamental da organização estatal, seria um mero instrumento nas mãos da classe dominante, com o fim de assegurar os interesses desta, dentro de um dado tipo de relações de produção.

3) O PENSAMENTO DE FERDINAND LASSALLE: A CONSTITUIÇÃO COMO A SOMA DOS FATORES REAIS DO PODER

O alemão Ferdinand Lassalle produziu importante texto em que buscou descrever o que vem a ser a essência de uma Constituição , divulgado durante uma conferência por ele proferida em 1863, para intelectuais e operários da antiga Prússia.

Para Lassalle, a Constituição é a lei suprema de um Estado, a lei básica, suporte de validade de todas as outras leis, e, como tal, representa a força eficaz e determinante que atua sobre tudo que nela se baseia. Nesse ponto é que se centra o estudo de Lassalle: que força é esta, que coloca a Constituição como fundamento de todas as outras leis e comportamentos do Estado? Qual será a essência, o verdadeiro conceito de uma Constituição?
A resposta para essa força da Constituição, segundo Lassalle, encontra-se nos fatores reais do poder que formam a sociedade, pois são eles que atuam como força ativa e eficaz que informa todas as leis e as instituições jurídicas vigentes.

Em parte de seu texto, Lassalle diz: "Esta é, em síntese, em essência, a Constituição de um País: a soma dos fatores reais do poder que regem uma nação. (...) Juntam-se esses fatores reais do poder, os escrevemos em uma folha de papel e eles adquirem expressão escrita. A partir desse momento, incorporados a um papel, não são simples fatores reais de poder, mas sim verdadeiro direito e instituições jurídicas. Quem atentar contra eles atenta contra a lei e por conseguinte é punido."

Dessa forma, a essência da Constituição (material) é a soma dos fatores reais do poder que regem uma nação, sendo a Constituição escrita nada mais do que um pedaço de folha de papel onde esses fatores são documentados, impressos, convertidos em direito.
A Constituição escrita seria, assim, nada mais do que os fatores reais do poder transcritos em folha de papel . Os denominados fatores reais do poder seriam o conjunto de forças que atuam politicamente na sociedade, tais como a monarquia, a grande burguesia, a aristocracia, os banqueiros e, num segundo plano, a pequena burguesia e a classe operária.

Na visão sociológica de Lassalle, a Constituição escrita não nasce de idéias ou princípios que se sobrepõem ao próprio homem, mas dos sistemas que os homens criam para, entre si, se dominarem, ou para se apropriarem da riqueza socialmente produzida.

Como se vê, Lassalle estabelece a existência de duas espécies de Constituição: uma Constituição real, efetiva (resultante da soma dos fatores reais do poder que regem uma nação), e uma escrita ( folha de papel , que se limita a reproduzir os tais fatores reais do poder).

A primeira Constituição real, efetiva está presente em todos os Países, visto que é impossível imaginar uma nação onde não existam fatores reais do poder, quaisquer que eles sejam. Em qualquer País, em qualquer época (feudalismo, absolutismo e na modernidade) sempre houve e sempre haverá uma Constituição real, efetiva.

A segunda espécie de Constituição Constituição jurídica, escrita, a folha de papel somente está presente naqueles Países que adotam um regime formal, em que as normas constitucionais estão consubstanciadas num documento especial, solenemente elaborado.

Finalmente, defende Lassalle que a Constituição jurídica (a folha de papel ) somente é vinculante quando corresponde à Constituição real (aos fatores reais do poder). Se não houver essa correspondência, entre a Constituição escrita (a folha de papel ) e a Constituição real (fatores reais do poder), a Constituição escrita sucumbirá necessariamente frente à Constituição real.

Assim, a Constituição escrita seria, em verdade, desprovida de força normativa, pois jamais poderia se impor às condições reais de poder na hipótese de conflitos ou descompassos, pois, na verdade, o que possui força normativa são os fatores reais do poder, e não a sua codificação numa folha de papel. Esse ponto relação entre Constituição escrita e Constituição real é tratado por Lassalle nos seguintes termos: Quando podemos dizer que uma Constituição escrita é boa e duradoura?

A resposta é clara e parte logicamente de quanto temos exposto: quando essa Constituição escrita corresponder à Constituição real e tiver suas raízes nos fatores do poder que regem o País. Onde a Constituição escrita não corresponder à real, irrompe inevitavelmente um conflito que é impossível evitar e no qual, mais dia ou menos dia, a Constituição escrita, folha de papel, sucumbirá necessariamente, perante a Constituição real, a das verdadeiras forças
vitais do País.

A idéia de Lassalle prevalência da Constituição real sobre a escrita termina por negar força normativa ao texto da Constituição jurídica, visto que a missão desta seria, apenas, a de constatar, justificar e formalizar as relações de poder dominantes na nação, os denominados fatores reais do poder.

Em síntese, temos o seguinte:
a) para Lassalle, as questões constitucionais não são, propriamente, questões jurídicas, mas sim político-sociais, visto que a Constituição de um País limita-se a retratar as relações de poder nele dominantes (o poder militar, representado pelas forças armadas; o poder estatal, representado pelos latifundiários; o poder econômico, representado pela grande indústria e pelo grande capital, e, finalmente, ainda que num segundo plano, o poder intelectual, representado pela consciência e pela cultura gerais);

b) as relações fáticas resultantes da conjugação desses fatores constituem a força ativa das leis e das instituições da sociedade, fazendo com que essas retratem, tão-somente, a correlação de forças que resulta dos fatores reais de poder;

c) esses fatores reais do poder formam, assim, a Constituição real do Estado (sempre presente em qualquer Estado, visto que não há Estado sem fatores reais de poder, sejam eles quais forem);

d) o documento formal chamado Constituição a Constituição jurídica, presente nos Estados que adotam Constituição escrita não passa de um pedaço de papel, que somente perdurará se corresponder à Constituição real, isto é, à soma dos fatores reais do poder; e) onde não houver essa correspondência, a Constituição jurídica (folha de papel) sucumbirá, sempre, frente à Constituição real (fatores reais do poder).

4) O PENSAMENTO DE KONRAD HESSE: A FORÇA NORMATIVA DA CONSTITUIÇÃO

Contrapondo-se à tese defendida por Ferdinand Lassalle, Konrad Hesse desenvolveu importante estudo no intuito de realçar a denominada força normativa da Constituição. Conforme visto, a tese de Lassalle, de cunho marcadamente sociológico, negava força normativa à Constituição jurídica, pois, no seu entender, caberia a esta, tão-somente, a representação dos fatores reais do poder que regem a nação, apresentando, em síntese, três conclusões: (1) a essência da Constituição é formada pela soma dos fatores reais do poder que atuam em uma determinada sociedade; (2) a Constituição nasce da necessariedade, não podendo a Constituição jurídica transformar ou se impor frente aos fatores reais do poder; (3) em caso de conflito entre a Constituição jurídica e a Constituição real (fatores reais do poder), aquela sucumbirá, necessariamente, frente a esta.

Konrad Hesse, sem desprezar o significado e a influência dos fatores históricos, políticos e sociais para a formação da Constituição, confere realce à denominada vontade de Constituição , buscando demonstrar a vinculatividade constitucional e a força normativa da Constituição, nos termos a seguir examinados.

Hesse concorda com Lassalle no tocante ao fato de ser a Constituição jurídica condicionada pela realidade histórica, não podendo ser separada da realidade concreta do seu tempo. Concorda, também, que a pretensão de eficácia da Constituição somente pode ser realizada se se levar em conta essa realidade. Entretanto, não concorda com Lassalle quando este conceitua a Constituição jurídica como pedaço de papel , pois, para Hesse, é inconcebível reduzir a Constituição jurídica à mísera função indigna de qualquer ciência de justificar as relações de poder dominantes.

Com efeito, segundo Hesse, a Constituição jurídica não configura apenas a expressão de uma realidade, dos fatores reais do poder. Ela significa mais do que o simples reflexo das condições fáticas de sua vigência, das forças sociais e políticas. Ainda que não de forma absoluta, a Constituição jurídica possui significado próprio, autônomo. Graças ao elemento normativo, ela ordena e conforma a realidade política e social.

Ela logra conferir forma e modificação à realidade, bem assim despertar a força que reside na natureza das coisas , tornando-a ativa. Assim, ela própria, a Constituição jurídica, converte-se em força ativa que influi e determina a realidade política e social.

Para Hesse, a Constituição contém, ainda que de forma limitada, uma força própria, motivadora e ordenadora da vida do Estado (força normativa da Constituição). Assim, a Constituição jurídica logra converter-se, ela mesma, em força ativa. Embora não possa, por si só, realizar nada, ela pode impor tarefas. A Constituição transforma-se em força ativa se essas tarefas forem efetivamente realizadas, se existir a disposição de orientar a própria conduta segundo a ordem nela estabelecida, se, a despeito de todos os questionamentos e reservas provenientes dos juízos de conveniência, se puder identificar a vontade de concretizar essa ordem. Enfim, a Constituição converter-se-á em força ativa se fizerem-se presentes, na consciência geral particularmente, na consciência dos principais responsáveis pela ordem constitucional -, não só a vontade de poder, mas também a vontade de Constituição.

Essa vontade de Constituição, segundo Hesse, origina-se de três vertentes diversas: (1) na compreensão da necessidade e do valor de uma ordem normativa inquebrantável, que proteja o Estado contra o arbítrio desmedido e disforme; (2) na compreensão de que essa ordem constituída é mais do que uma ordem legitimada pelos fatos, e que, por isso, necessita estar em constante processo de legitimação; (3) na consciência de que, ao contrário do que se dá com uma lei do pensamento, essa ordem não logra ser eficaz sem o concurso da vontade humana, que a manterá por atos volitivos.

Em síntese, podemos afirmar que Hesse não nega a influência dos fatores reais do poder na realização da Constituição jurídica, visto que esta não está e nem poderia estar desvinculada da realidade histórica e concreta do seu tempo. Todavia, ela não está condicionada, simplesmente, por essa realidade. A Constituição jurídica e a Constituição real estão em relação de coordenação, condicionando-se mutuamente. Assim, em caso de eventual conflito, a Constituição jurídica não deve ser considerada, necessariamente, a parte mais fraca, pois existem pressupostos realizáveis que, mesmo no caso de confronto, permitem assegurar a força normativa da Constituição jurídica.

Em razão dessa coordenação entre a realidade fática (Constituição real) e a realidade jurídica (Constituição jurídica), afirma Hesse que tanto aqueles que procuram respostas à força normativa da Constituição exclusivamente nos fatores reais de poder, como aqueles que buscam respostas apenas na Constituição jurídica, estão equivocados, pois ignoram o espaço relacional, de condicionamentos mútuos, inseparáveis (afinal, ensina Hesse, a essência da normatividade constitucional encontra-se na sua pretensão de eficácia, de sua realização sobre o real).

A respeito da força normativa da Constituição, destacamos as seguintes conclusões de Hesse:

a) quanto mais o conteúdo de uma Constituição lograr corresponder à natureza singular do presente, tanto mais seguro há de ser o desenvolvimento de sua força normativa. Essa correspondência há que levar em conta não só os elementos sociais, políticos e econômicos dominantes (os denominados fatores reais do poder , por Lassalle), mas também o estado espiritual de seu tempo;

b) é também importante para a manutenção da força normativa da Constituição que ela se mostre em condições de adaptar-se a uma eventual mudança desses elementos sociais, políticos e econômicos. Para isso, a Constituição deve ser sintética, contendo, tão-somente, disposições organizativas e alguns princípios fundamentais, pois a constitucionalização exacerbada de interesses momentâneos ou particulares exige, em contrapartida, constantes revisões constitucionais, com a inevitável desvalorização da força normativa da Constituição;

c) a preservação dos princípios constitucionais, a todo custo, mesmo que se revele contrário a algum interesse momentâneo, também é imprescindível para a consolidação da força normativa da Constituição. A denominada vontade de Constituição deve ser preservada, mesmo que, para isso, tenhamos que renunciar a alguns benefícios, ou até a algumas vantagens justas, pois quem se mostra disposto a sacrificar um interesse em favor da preservação de um princípio constitucional, fortalece o respeito à Constituição e garante um bem da vida indispensável à essência do Estado, mormente ao Estado democrático;

d) devem ser evitadas, em favor da força normativa da Constituição, revisões constantes do texto constitucional, sob a alegação de suposta necessidade política. A estabilidade constitui condição fundamental de eficácia da Constituição; a freqüência das reformas constitucionais abala a confiança, debilitando a sua força normativa;

e) a interpretação constitucional é fator decisivo no tocante à sua força normativa. Se o Direito e, sobretudo, a Constituição, têm a sua eficácia condicionada pelos fatos concretos da vida, não se afigura possível que a interpretação faça deles tabula rasa. Ela há de contemplar essas condicionantes, correlacionando-as com as proposições normativas da Constituição, sendo considerada adequada aquela interpretação que possibilite a aprendizagem da Constituição jurídica com a realidade, isto é, aquela que consegue concretizar o sentido da proposição normativa dentro das condições reais dominantes numa determinada situação.

A dinâmica existente na interpretação construtiva constitui condição fundamental da força normativa da Constituição e, por conseguinte, de sua estabilidade. Caso ela venha a falhar, tornar-se-á inevitável, cedo ou tarde, a ruptura da situação jurídica vigente. Finalmente, assevera Hesse que o Direito Constitucional deve explicitar as condições sob as quais as normas constitucionais podem adquirir maior eficácia possível, propiciando, assim, o desenvolvimento da dogmática e da interpretação constitucional. Portanto, compete ao Direito Constitucional realçar, despertar e preservar a vontade da Constituição, que, indubitavelmente, constitui a maior garantia de sua força normativa.

LASSALE

1) A Constituição consiste na soma dos fatores reais de poder que regem uma determinada nação; 2) No caso de conflito entre a Constituição real ( atores reais de poder ) e a Constituição jurídica ( folha de papel ), esta sempre sucumbirá frente àquela;
3) Visão sociológica de Constituição.

HESSE

1) A Constituição, embora influenciada pelos fatores reais do poder, possui força normativa própria;

2) No caso de conflito entre a Constituição real e a Constituição jurídica, não se pode afirmar que esta necessariamente sucumbirá;

3) Visão jurídico-normativa de Constituição.