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26/03/2006

Banco estatal beneficiou aliados de Alckmin

Folha Online - FREDERICO VASCONCELOS - 26/03/2006 - 09h16


O governo Geraldo Alckmin (PSDB) direcionou recursos da Nossa Caixa para favorecer jornais, revistas e programas de rádio e televisão mantidos ou indicados por deputados da base aliada na Assembléia Legislativa.

Documentos obtidos pela Folha confirmam que o Palácio dos Bandeirantes interferiu para beneficiar com anúncios e patrocínios os deputados estaduais Wagner Salustiano (PSDB), Geraldo "Bispo Gê" Tenuta (PTB), Afanázio Jazadji (PFL), Vaz de Lima (PSDB) e Edson Ferrarini (PTB).

A cúpula palaciana pressionou o banco oficial para patrocinar eventos da Rede Vida e da Rede Aleluia de Rádio. Autorizou a veiculação de anúncios mensais na revista "Primeira Leitura", publicação criada por Luiz Carlos Mendonça de Barros, ministro das Comunicações no governo Fernando Henrique Cardoso. Ele é cotado para assessorar Alckmin na área econômica. Recentemente, a Quest Investimentos, empresa de Mendonça de Barros, foi escolhida para gerir um novo fundo da Nossa Caixa.

O banho de ética anunciado pelo candidato tucano à Presidência da República torna-se uma ducha de água fria com o resultado de uma auditoria na área de publicidade da Nossa Caixa, que revela o descontrole nas contas, e com a investigação, pelo Ministério Público do Estado, a partir de denúncia anônima, sobre o uso político-partidário do banco oficial.

Entre setembro de 2003 e julho de 2005, as agências de propaganda Full Jazz Comunicação e Propaganda Ltda. e Colucci Propaganda Ltda. continuaram prestando serviços sem amparo legal, pois o banco não renovara os contratos, conforme a Folha revelou em reportagem de dezembro último. O caso está sendo apurado pelo promotor de Justiça da Cidadania Sérgio Turra Sobrane.

Ao analisar 278 pagamentos às duas agências no período em que operaram sem contrato --no total de R$ 25 milhões--, a auditoria interna apontou irregularidades em 255 operações (91,73%).

Não foram localizados documentos autorizando pagamentos que somavam R$ 5,1 milhões. Em 35% dos casos, não havia comprovantes da realização dos serviços. Em 62,23%, os pagamentos não respeitaram o prazo mínimo legal de 30 dias. O patrocínio de campanhas de marketing direto era autorizado verbalmente.

A responsabilidade por esses pagamentos é atribuída ao ex-gerente de marketing Jaime de Castro Júnior, 48, ex-auditor do banco, com 28 anos de casa. Ele admitiu ter liberado pagamentos em valores acima dos limites que podia autorizar e, a partir de 2002, sem ter procuração para tal. "Reafirmo que assumi a responsabilidade pela liberação dos pagamentos, dados sua urgência e os interesses da instituição", afirmou à comissão de sindicância.

Ele foi demitido por justa causa, em dezembro, pelo presidente do banco, Carlos Eduardo Monteiro, sob a acusação de "mau procedimento", "desídia" e "indisciplina". O ex-presidente do banco Valdery Frota de Albuquerque também foi responsabilizado.

Pressões

Por entender que a comissão de sindicância poupou outros envolvidos, inclusive o presidente do banco, o ex-gerente preparou um relatório de 42 páginas em que revela outras irregularidades e as pressões que recebeu do Palácio dos Bandeirantes. "Houve atendimentos a solicitações de patrocínio e mídia, de deputados estaduais da base aliada, nas ocasiões de votação de projetos importantes para o governo do Estado", afirma Castro Júnior nessa peça.

O ex-gerente explicitou: "Por ser um órgão do governo do Estado, a pressão de cunho político para liberação de anúncios, verbas para eventos e patrocínios sempre foi muito forte. Fosse através da Secretaria da Comunicação, diretamente por deputados, vereadores, secretarias de Estado, do gabinete do governador, para atendimentos de natureza política, para sustentação da base política do governo do Estado".

Há suspeitas de que o esquema envolve outras empresas do Estado. Consultadas, Sabesp, Prodesp, CDHU e Dersa não responderam questionário da Folha.

O direcionamento da publicidade pelo Palácio dos Bandeirantes veio à tona com a quebra de sigilo da correspondência (e-mails) de Castro Júnior, autorizada pela direção do banco nas investigações.

Essa troca de mensagens indica que as determinações para a veiculação de interesse dos tucanos partiram do assessor especial de Comunicação do governo do Estado, jornalista Roger Ferreira.

Ele atuou nas equipes de marketing das campanhas presidenciais de Fernando Henrique Cardoso e José Serra. Foi chefe da Assessoria de Comunicação da Caixa Econômica Federal, entre 1999 e 2002, na gestão de Valdery Frota de Albuquerque, que o levou para assessorá-lo na Nossa Caixa.

Jornada dupla

Antes de trabalhar com Alckmin no Palácio dos Bandeirantes, Ferreira foi assessor da presidência da Nossa Caixa, entre março e outubro de 2003. Recebia R$ 17 mil mensais, salário superior ao do presidente do banco. O jornalista foi contratado pela agência Full Jazz, empresa cujos serviços deveria controlar. A agência pagava a Ferreira, que fornecia nota fiscal da RF Produções e Editora Ltda., com sede em São Lourenço da Serra (SP).

A agência cobrava esses "serviços" do banco, com acréscimo de 10% a título de honorários. Trata-se de forma de driblar a legislação que veda a contratação sem licitação de serviços de publicidade e divulgação.

Segundo Castro Júnior, "a partir de sua contratação, o sr. Roger Ferreira passou a manter estreito relacionamento com as duas agências de propaganda, por ordem da presidência, coordenando as ações de marketing, notadamente aquelas pertinentes a campanhas e anúncios na mídia".

"Ele não poderia jamais ser contratado pela agência. Houve uma ilegalidade", diz o advogado Toshio Mukai, especialista em contratos e licitações públicas. Com a saída de Ferreira, Monteiro determinou a contratação da jornalista Shirley Emerich, para substituí-lo, no mesmo esquema da Full Jazz e o mesmo salário. Ela deixou a Nossa Caixa em julho de 2005, com o rompimento do contrato com a agência. Castro Júnior diz que não havia rubricas contábeis específicas para os pagamentos mensais dessas contratações.